Memoria operária, reconfigurações produtivas e novos usos do património industrial no Vale do Ave

Research output: Chapter in Book/Report/Conference proceedingChapter

Abstract

Num artigo de 2010, Jaume Franquesa denota como a dimensão económica do património, designadamente o seu papel nos processos de acumulação de capital, é frequentemente negligenciada pelos antropólogos, centrados sobretudo no seu caráter cultural e identitário (2010, p. 40). Apesar de, tendencialmente, os discursos e processos de patrimonialização se revestirem de uma aparência economicamente desinteressada, o antropólogo catalão sustenta comoestes desempenham, naverdade, um papel central na produção de valor que enforma o próprio objeto patrimonial. Tal é notório pela forma como, nas últimas décadas, a inflação patrimonial – para recorrer ao termo de Françoise Choay (1992) – tem sido acompanhada com uma forte expansão dos processos de mercantilização (FRANQUESA, 2010, p. 54). Neste sentido, Franquesa propõeno referido artigo um conjunto de ferramentas teóricas que ajudem a pensar esta relação entre património e mercado. Segundo o antropólogo, a categoria de património revela-se desadequada a este propósito, pelo seu caráter essencializador, ocultando o processo mediante o qual o objeto patrimonial adquire valor. Apoiando-se na tradição da antropologia económica – designadamente em Annette Weiner (Inalienable Possessions. The paradox of keeping-while-giving 1992) e Maurice Godelier (L’énigme du don 1996), que estudam a questão da posse em sociedades de reciprocidade não económica –, propõe guardar como categoria analítica alternativa, uma questão que desenvolve posteriormente (FRANQUESA, 2013) de forma articulada com o contexto de Palma, na ilha de Maiorca (Espanha). A inter-relação entre os processoseconómicos e os de patrimonialização constitui-se como o ponto de partida do estudo que informa este artigo, desenvolvido a partir de um fenómeno de proliferação recente em Portugal – as fábricas criativas (REI, 2016a). Conforme nota Franquesa na citação que dá o mote a este artigo,os processo económicos sempre decorrem nalgum lugar (2007, p. 127), constituindo-se a regeneração urbana como uma das suas manifestações mais visíveis. Partindo da requalificação de antigas unidades industriais com significativo valor patrimonial e forte implantação na memória coletiva da região, as fábricas criativas– isto é, a requalificação de antigos espaços industriais em espaços de indústrias criativas –têm como princípio transformar anteriores marcos de desenvolvimento económico em polos de inovação de referência, através da instalação de incubadoras de indústrias criativas. Assentes na desvalorização e revalorização cíclica de espaços, estes projetos constituem-se, neste sentido, como mecanismos de criação de novas oportunidades de mais-valia, num processo de destruição criativa (SCHUMPETER, 1961 [1943])que acompanha as crises cíclicas do capitalismo e constitui a base do seu sistema de acumulação (FRANQUESA, 2007, p. 128).
Original languagePortuguese
Title of host publicationMemória e Patrimônio
Subtitle of host publicationDiálogos entre Brasil e Portugal
EditorsCharles Monteiro , Klaus Hilbert , Paula Godinho
Place of PublicationPorto Alegre
PublisherediPUCRS - Editora da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul
Pages171-190
Number of pages20
ISBN (Print)978-85-397-1032-4
Publication statusPublished - 2017

Publication series

NameSérie História
Volume78

Keywords

  • Memória
  • Património
  • Trabalho

Cite this