Abstract
Ao longo dos tempos, a reflexão sobre o pensamento matemático e os diferentes modos de raciocínio tem ocupado um lugar de destaque quer no desenvolvimento da matemática quer da investigação em educação matemática. Ao raciocínio matemático estão associadas diversas formas de pensamento importantes para todos aqueles que fazem Matemática, tais como: prever resultados, essenciais para a formulação de conjeturas; questionar soluções, mesmo as corretas; procurar padrões; recorrer a representações alternativas; analisar e sintetizar. O desenvolvimento do raciocínio matemático ocupa um papel de relevo nos currículos da generalidade dos países.Nos programas de matemática portugueses, tanto do ensino básico como do ensino secundário, e como algum reflexo dos resultados da investigação em educação matemática, é dada especial atenção ao raciocínio matemático, como capacidade transversal a qualquer tema ou tópico matemático. O desenvolvimento desta capacidade transversal é visto como essencial ao sucesso dos alunos não só na escola mas também na sua vida futura.As experiências de aprendizagem que são proporcionadas aos alunos, e que influenciam fortemente o que eles aprendem e a qualidade dessas aprendizagens, dependem não só das orientações curriculares mas também da visão da matemática escolar que predomina na sala de aula. Se a matemática é encarada como um conjunto de regras, impostas externamente para serem aplicadas de forma mecânica e sem necessidade de compreensão, aprender matemática reduz-se a ouvir a explicação ou exposição do professor e a imitar os seus processos de resolução de tarefas semelhantes, enfatizando o saber fazer e não perceber o que se faz. Por outro lado, se a matemática é vista como uma construção dinâmica de conhecimento, onde é necessário atribuir significado a fórmulas, símbolos, procedimentos e processos usados na resolução de tarefas de natureza diversificada, estabelecendo uma rede de conceitos interligados, então aprender matemática envolve um leque variado de métodos como a formulação de conjeturas, a observação de regularidades, a procura de generalizações, a explicação e justificação de ideias matemáticas. Para além do saber fazer enfatiza-se a compreensão do que se faz e os motivos por que se faz.As tarefas que são propostas em sala de aula bem como os recursos (em particular os recursos tecnológicos e os materiais manipuláveis) que são disponibilizados para apoiar a sua implementação influenciam o desenvolvimento do raciocínio matemático dos alunos. A par do papel que as tarefas desempenham devemos ter em conta o contributo do professor na condução de toda a atividade matemática dos alunos resultante do seu envolvimento nas tarefas. A valorização de raciocínios incompletos ou mesmo imprevistos devem ser vistos como trampolins para uma discussão matemática rica. A comparação e contraste entre diferentes estratégias de resolução de uma mesma tarefa, a explicação e justificação das ideias ou processos usados por terceiros, etc. são exemplos dos aspetos complexos que o professor deve equacionar de modo a promover o desenvolvimento do raciocínio matemático dos alunos. Mas, afinal, o que é o raciocínio matemático? Usa-se o termo raciocínio partindo do princípio que existe um entendimento comum sobre o seu significado – utilizando-se, também, o termo pensamento com o mesmo sentido. Os vários textos incluídos neste número da Investigação em Educação Matemática são um exemplo claro da multiplicidade de abordagens possíveis ao tema, da diversidade de termos que estão associados ao raciocínio (raciocínio geométrico, raciocínio algébrico, raciocínio espacial, raciocínio visual, raciocínio indutivo, raciocínio abdutivo, raciocínio dedutivo, intuição, demonstração, argumentação, etc.). Urge, por que se acredita que tal é uma questão teórica que pode ter implicações para o processo de ensino e aprendizagem da matemática, procurar um maior entendimento sobre o que é o raciocínio matemático e como é que ele pode ser desenvolvido nos alunos. Estes textos foram sujeitos a um processo de revisão por pares e referem-se10às comunicações e pósteres apresentados no Encontro de Investigação em Educação Matemática – EIEM2013 – realizado nas Penhas da Saúde, Covilhã, nos dias 18 e 19 de maio de 2013, subordinado ao tema Raciocínio matemático.Nesta publicação existem cinco secções. A primeira secção é uma evocação a Paulo Abrantes, por ocasião do décimo aniversário do seu desaparecimento, à sua pessoa e, sobretudo, ao seu trabalho vasto e marcante em educação matemática no nosso país e além fronteiras. Destacando algumas ideias centrais de Paulo Abrantes sobre o raciocínio matemático, o seu significado e importância no desenvolvimento curricular, Leonor Santos desafia os participantes no EIEM2013 a perspetivar o futuro olhando o presente, detendo-se, entre outros aspetos, nas ações do professor de matemática que podem promover o desenvolvimento do raciocínio matemático nos alunos, no desenvolvimento de uma aprendizagem matemática com compreensão, e no lugar e papel do raciocínio matemático num currículo centrado na preparação de um cidadão responsável, crítico e participante.Na segunda secção são apresentadas as conferências plenárias do Encontro. Maria Alessandra Mariotti, da Universidade de Siena, Itália, no artigo intitulado Mathematical reasoning: Conjecturing and proving in a Dynamical Geometry Environment, debruça-se sobre a complexidade do funcionamento dos ambientes de geometria dinâmica com o intuito de discutir as potencialidades didáticas das várias ferramentas que lhes estão associadas. À luz da Teoria de Mediação Semiótica, descreve como os significados emergem em diferentes processos exploratórios (modalidades de arrastamento com respeito à noção de conjetura geométrica) e como se relacionam com as premissas, as conclusões e as ligações condicionais entre estas. O segundo artigo é da autoria de Ana Barbosa, da Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico de Viana do Castelo, e tem como título O contributo da visualização no desenvolvimento do raciocínio funcional. Tendo como objetivo global a compreensão do modo como alunos do 6.º ano de escolaridade resolvem problemas envolvendo a generalização de padrões, em contextos visuais, a autora foca-se nas estratégias de generalização privilegiadas por quatro alunos, no papel que a visualização tem no raciocínio funcional que evidenciam. Além disso, discute como alguns fatores poderão influenciar as opções dos alunos em termos de estratégias de generalização. As tarefas que envolvem a exploração de padrões em contextos visuais surgem como facilitadoras do aparecimento de estratégias de generalização variadas mas a compreensão, pelos alunos, das potencialidades e limitações de cada estratégia mostra-se essencial para o desenvolvimento de um raciocínio (funcional) mais flexível.Cada uma das três secções seguintes é dedicada ao conjunto de comunicações que constitui cada grupo de discussão do EIEM2013. Estes grupos não foram constituídos à priori mas surgiram após a submissão de trabalhos para o EIEM2013 agregando os textos conforme as temáticas gerais que estes abordam. As comunicações do grupo de discussão 1 reúnem-se em torno da temática do Raciocínio em Geometria. Discutem-se tipos de raciocínio (indutivo, abdutivo e dedutivo) ancorados em situações de ensino-aprendizagem de tópicos de Geometria ou em contextos visuais, ao longo de todos os ciclos de escolaridade. Ao papel das tarefas de aprendizagem no desenvolvimento de processos variados de raciocínio (relacionados com a intuição, formulação e teste de conjeturas, explicação, justificação, prova) é dada especial atenção, bem como às características, potencialidades e limitações, dos ambientes de geometria dinâmica que contribuem para esse desenvolvimento.No segundo grupo de discussão, dedicado ao tema Raciocínio em Números e Álgebra, é feita uma reflexão sobre aspetos teóricos, de aprendizagem e do ensino, focando a prática profissional do professor de Matemática e o desenvolvimento curricular. As experiências de ensino e aprendizagem referidas englobam alunos desde o pré-escolar ao ensino secundário e, ainda, alunos futuros professores de Matemática. São levantadas questões quanto às inteligências múltiplas postas em movimento na sala de aula e sobre o significado dos termos raciocínio matemático e pensamento matemático. Ao processo de generalização é dada bastante ênfase, bem como à sua relação12com as representações e os processos de significação. Discute-se também o processo de abstração e a sua relação com a generalização matemática, problematizando-se a passagem da aprendizagem da Aritmética para a Álgebra. A ligação entre comunicação e raciocínio é questionada, refletindo-se, ainda, sobre a coordenação do conceito de fração com o raciocínio multiplicativo, bem como o desenvolvimento do raciocínio do professor de Matemática a partir da discussão, interpretação e atribuição de significado a produções de alunos.Finalmente, a quarta secção desta publicação é dedicada aos trabalhos recebidos que abordam a temática do Raciocínio e Demonstração, correspondendo ao grupo de discussão 3, que se organiza em torno da demonstração, do pensamento matemático avançado e do conhecimento matemático. Ao nível da demonstração são discutidas diversas dimensões que englobam problemas em contexto histórico, as diferentes funções da demonstração e a compreensão do método de demostração direto. A aprendizagem dos conceitos matemáticos e a qualidade dessas mesmas aprendizagens são discutidas à luz das teorias do pensamento matemático avançado, procurando-se evidenciar os raciocínios dos alunos que lhe estão inerentes. O recurso a taxonomias revela-se uma ferramenta útil para categorizar os diferentes raciocínios e aferir a qualidade das aprendizagens. O conhecimento matemático é abordado a partir do paradigma das inteligências múltiplas e do conhecimento matemático que o professor mobiliza para desenvolver os processos de raciocínio dos alunos.Para este número da Investigação em Educação Matemática, dedicado ao tema Raciocínio matemático, contribuíram muitos autores, a quem se agradece a colaboração prestada, o importante papel na discussão do tema e no avanço trazido ao conhecimento e investigação acumulados em Educação Matemática. Dos trabalhos discutidos, e aqui reunidos, emergem implicações várias para o ensino e a aprendizagem da matemática, bem como para a formação de professores e para o desenvolvimento curricular. Juntamente com essas implicações, novas questões se levantam (e outras persistirão), abrindo caminho para investigações futuras.
Original language | Unknown |
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Place of Publication | Lisboa |
Publisher | Sociedade Portuguesa de Investigação em Educação Matemática |
ISBN (Print) | 2182-0023 |
Publication status | Published - 1 Jan 2013 |