Entre musicking e roleplay: Vídeos musicais de videojogos e a partilha de experiências online ‹semireais›

Partilhada por diferentes agentes na esfera multifacetada das práticas musicais e seus signifcados, a noção de ‘musicar’ (“to music”, de Christopher Small) é também conjugada nos vários modos de (inter)acção e actuação em videojogos (“to play”). Em particular, é preciso jogar um determinado jogo para que a sua narrativa ‘exista’, assim como, na maior parte dos casos, para ouvir a música que a acompanha. No entanto, seja através de discos de vinil ou listas de reprodução no Spotify, a música de praticamente qualquer produto audiovisual encontrase, hoje em dia, acessível, deslocando-a do seu contexto original para um que, inevitavelmente, se torna mutável devido à multiplicidade de formas de utilização e de escuta. Paralelamente ao processo actual da ‘videoludifcação’ da sociedade (Muriel e Crawford 2018) e a infuência próxima dos videojogos em outros formatos audiovisuais, a dimensão musical deste meio desempenha um papel central nesta rede complexa de interactividade e imersão no âmbito de uma narrativa virtual, sendo que esta última pode, também, operar fora do seu contexto de partida. Neste sentido, vídeos musicais de covers de videojogos são uma presença audiovisual notável no YouTube e das respectivas comunidades online, promovendo o fuxo criativo e a participação dos utilizadores enquanto, em simultâneo, estendem a longevidade de uma narrativa digital para lá da sua jogabilidade. Não obstante a fórmula familiar e predominante dos vídeos de covers – o intérprete e o seu instrumento num contexto doméstico – o presente trabalho procura examinar vídeos musicais de covers de música de videojogos, um tipo de conteúdo frequente neste circuito mas ainda negligenciado no campo da musicologia. Através de imagens em movimento num palco que coloca a ‘vida real’ em cena, artistas e fãs vestidos como personagens virtuais específcos tocam a música e jogam com os elementos destes videojogos de modo a representar um videoclip de uma determinada faixa destas bandas sonoras. Ao criar uma estética “autêntica” da virtualidade concebida na narrativa de um jogo, estes vídeos contribuem para o fenómeno de ‘roleplay’ e actuam com o utilizador ao remeter para a sua experiência pessoal durante o processo de jogabilidade, fomentando assim uma actuação ‘semi-real’ (Juul 2005) entre participantes.