De um avanço quase inexplicável: notas sobre a noção de pesquisa de ponta na literatura e nas artes

Que as questões do progresso, do avanço ou do aperfeiçoamento (implícitas na ideia de pesquisa de ponta) se não levantem no campo das ciências humanas como no das ciências naturais é há muito reconhecido. Que, porém, as primeiras lidem com práticas e objectos que arruinam – mais do que simplesmente contornam – a própria noção de progresso é que me interessa aqui salientar. Partindo de alguns casos paradigmáticos – nos campos do pensamento filosófico e das práticas literárias e artísticas – tentarei explorar diferentes modalidades dessa subversão. Tomarei como mote palavras pronunciadas por Valéry num “Discurso no PEN Club”: “Je trouve cette réunion presque inexplicable. Il y a en elle je ne sais quoi de paradoxal. On conçoit que des géomètres, des économistes, des fabricants de toutes races se puissent assembler utilement, car ils sont voués à des études, attachés à des intérêts dont l’objet est unique et identique. Mais des écrivains!… Mais des hommes dont l’art consiste à développer ce qui sépare le plus nettement – le plus cruellement peut-être – un peuple d’un autre peuple! Ici, Messieurs, il faut invoquer le miracle. Ce fut, naturellement, un miracle d’amour.”