Abstract
Contextos complexos e de grande incerteza como sejam a gestão ambiental e conservação de espécies exigem cada vez mais, diálogo entre as várias especialidades e entre estas e o cidadão, na construção de soluções colaborativas convergentes. Estes formatos têm-se vindo a impor mais recentemente, mas ainda muito há a explorar. A participação passiva, de carácter mais informativo e de consulta (e.g., consultas e audiências publicas) está consideravelmente consolidada no nosso contexto. O mesmo não se pode dizer da participação ativa com o envolvimento efetivo dos interessados contribuindo para o processo. O envolvimento efetivo e participação pública ativa dos cidadãos tem-se tornado uma exigência crescente, tendo já conquistado um número substancial de especialistas. Simultaneamente, a literatura evidencia que o valor das relações sociais traz à gestão ambiental, dividendos acrescidos, sugerindo a necessidade de articular os elementos biológicos e sociais de conservação (Pretty et al., 2004). Os formatos mais tradicionais apoiados na comunicação “one way” tem vindo a dar lugar a “forums dialógicos e discursivos que visam “empower” (capacitar) as pessoas no que se refere a assuntos que as afetam ou às suas comunidades” (Pidgeon et al., 2014).
Simultaneamente, os problemas de grande complexidade, sendo mesmo apelidados de perversos (Rittel e Weber, 1973) que se nos colocam em contextos de sustentabilidade, dadas as suas características, exigem formatos mais transversais de abordagem que articulem conhecimentos diversos, especialidades profissionais variadas, intervenientes com poder e interesses desigual e questões de níveis distintos. Para produzir resultados esta diversidade de elementos exige espaços de diálogo onde os diversos stakeholders possam, em ambiente seguro e construtivo, partilhar experiências e informação e construir soluções colaborativas. Para serem produtivos, estes espaços devem obedecer a uma série de requisitos – conceitos chave para uma participação efetiva – além de contemplarem formatos estruturados e faseados, conduzidos sob facilitação profissional, em especial quando exista conflito (Vasconcelos et al., 2009).
Sendo o envolvimento dos stakeholders no processo um elemento crucial para assegurar uma gestão ambiental sustentável a longo prazo, é da maior relevância, formatos mais interativos de participação, que nos apoiem no terreno, uma vez que:
· O capital social é crucial para ajustar atitudes e comportamentos. Para assegurar a sustentabilidade temos de atuar ao nível das mudanças, atitudes e comportamentos, pois é imprescindível trazer as pessoas para os processos de gestão ambiental. Consciencializa-las e sensibilizá-las para as questões que se nos colocam ao nível ambiental revela-se fulcral para as tornarmos elementos despertos, corresponsáveis e interventivos e assumindo-se como elementos centrais ao nível da co-gestão. Envolvendo-as direta e efetivamente num processo de diálogo genuíno de co-construção os participantes tornam-se agentes de mudança resultante da criação e consolidação do capital social, estabelecimento de redes sociais de conhecimento e confiança mútua capazes de se articularem e trabalharem conjuntamente. Em muitos contextos a gestão ambiental assume especial relevo “o valor das relações sociais, na forma de confiança, ajustes recíprocos, regras desenvolvidas localmente, normas e sanções, e instituições emergentes” (Pretty et al., 2004), reforçando a necessidade de se articularem elementos biológicos e sociais para uma gestão colaborativa.
· A participação interativa constitui uma mais-valia para a gestão ambiental. Embora muito se tenha já discutido sobre participação pública, questões centrais têm estado omissas do debate acarretando situações de grande ambiguidade, nomeadamente que tipo de participação, quando deve ser conduzida, como fazê-lo e porquê? (Day, 1997). De uma forma geral tem-se encarado a participação como um fenómeno uniforme e homogéneo esquecendo a sua diversidade. No entanto, há diferentes níveis de participação que vão desde formatos mais passivos e informativos (os mais usados) a formatos mais interventivos e mobilizadores, como sejam a participação (1) interativa, na qual as pessoas participam em análises conjuntas, desenvolvem planos de ação, e formam ou fortalecem grupos locais ou instituições e (2) auto-mobilização, na qual as pessoas participam assumindo iniciativas independentes e o controle de como os recursos são usados (Pretty, 2002). Destes tipos de participação mais ativa emergem frequentemente soluções inovadoras e mais completas, do que nos tipos de participação passiva, consultiva ou comprada (O’Riiordan & Stoll-Kleeman, 2002; Pretty, 2002). São os formatos mais ativos que apresentam maior potencial de transformação social.
· Para gerar o capital social precisamos de participação ativa. Uma forma de potenciar o capital social, imprescindível a uma boa gestão ambiental a longo prazo, é fomentar a interação entre os vários stakeholders. A participação interativa, se bem conduzida e obedecendo aos requisitos concetuais de suporte (Vasconcelos et.al, 2009), contribui para a formação do capital social, intelectual e politico (Gruber, 1994) pois ao criar espaços de diálogo genuíno (no sentido de Habermas) constitui um processo de aprendizagem mútua emancipatória. Estes espaços, também apelidados de discursivos constituem os forums de diálogo fulcrais para a liderança para o bem comum (Bryson et al.,1992). A literatura refere que os envolvidos nestes contextos desenvolvem maior conhecimento dos problemas existentes, aprendem mutuamente sobre a complexidade física e ecológica dos ecossistemas visados, e constroem decisões conjuntas para atuar. Se forem dadas as ferramentas adequadas e a oportunidade para participar/contribuir ao cidadão, tem a capacidade de debater questões complexas relacionadas com o ambiente (Vasconcelos et al., 2013, Vasconcelos et a.l, 2012).
Um processo desta natureza gera dois tipos de resultados: (1) os instrumentais (e.g., ações a implementar, estratégias a seguir) que embora extremamente importantes não serão abordados nesta comunicação; (2) os processuais, que se relacionam com mudanças ao nível da forma como os participantes vêem o mundo, na forma de atuar, na compreensão da sua própria capacidade para contribuir e influenciar o processo. A comunicação foca-se especificamente nestes últimos uma vez que são fundamentais para a capacitação e transformação social na procura de uma gestão mais sustentável. Com base numa metodologia assente numa grelha de avaliação, apoiada e estruturada em elementos processuais, os autores comparam três caso de estudo de desenvolvimento sustentável costeiro. Partindo da ideia que a sensibilização e consciencialização do valor dos recursos costeiros pelos cidadãos pode encorajar as comunidades locais a tornarem-se elas mesmas promotoras da sustentabilidade através do uso e disseminação de boas práticas, os casos de estudo através de metodologias participativas emancipatórias envolveram os cidadãos diretamente em Fórums de Diálogo:
· MARGov visando o empowerment de atores chave para assegurar a sustentatbilidade do Oceano e reforçar a dimensão socio-ecológica, contribuindo para a minimização do conflito através da promoção de um diálogo eco-social entre os cientistas e cidadãos. Um modelo de governância foi construído colaborativamente;
· O projeto Value of Waves and Ocean Culture que considera a avaliação das dimensões económicas, ambientais, sociais e culturais da onda, e que tem estado a desenvolver conjuntamente com os vários atores, um modelo de governância conjunto;
· E finalmente, MARLISCO visando promover uma consciencialização alargada sobre os problemas do lixo marinho tem como objetivo trazer todos os setores da sociedade visando a geração de soluções e ações que reduzam o impacto da ação humana.
Em qualquer um dos projetos referidos recorreu-se à criação de espaços abertos de diálogo para envolver uma diversidade de stakeholders sociais. Estes espaços públicos de interação demonstraram responder de forma mais adequada às necessidades de articulação de um número diversificado de stakeholders, defendendo interesses variados e potenciando e fundindo vários tipos de conhecimento. Por um lado estes formatos têm sido bem-sucedidos ao responderem de forma mais adequada às exigências de um envolvimento mais direto do cidadão, e por outro a troca de ideias e experiências têm contribuído para soluções colaborativas mais fundamentadas (esclarecidas e informadas) e portanto menos contestadas. Estes espaços representam plataformas de troca de informação e conhecimentos que frequentemente nos formatos tradicionais não têm a oportunidade de se cruzar. Esta comunicação apresenta os três caso de estudo, explora as metodologias interativas desenvolvidas para cada contexto e os resultados atingidos e finalmente, as lições aprendidas. Estas são de importância capital para sustentar e reforçar decisões e estratégias para a zona costeira e fornecer linhas orientadoras de gestão costeira a serem replicadas noutros locais.
Original language | Portuguese |
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Publication status | Published - 2015 |
Event | XVII Encontro da Rede de Estudos Ambientais em Países de Língua Portuguesa - Universidade de Cabo Verde e Hotel Vulcão, Cidade Velha, Cape Verde Duration: 9 Sept 2015 → 12 Sept 2015 |
Conference
Conference | XVII Encontro da Rede de Estudos Ambientais em Países de Língua Portuguesa |
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Country/Territory | Cape Verde |
City | Cidade Velha |
Period | 9/09/15 → 12/09/15 |