Análise do comportamento rítmico-locomotor de crianças com 4 e 5 anos em situação de dança utilizando música gravada com diferentes andamentos

No início do século XX, pedagogos como Jaques-Dalcroze, Orff/Keetman e Willems inovaram o ensino da música ao introduzir a prática de movimento corporal com intencionalidades de desenvolvimento musical. No âmbito
do desenvolvimento rítmico, vários estudos da década de 1970 sugerem a existência de uma relação positiva entre a realização de um programa de atividades de música e movimento e o comportamento rítmico-motor na infância. Contudo, existem ainda lacunas por preencher no estudo dessas tendências de comportamento nas crianças.
Este estudo surge enquadrado na unidade curricular de Psicologia e Pedagogia Musical do Mestrado em Ciências Musicais (NOVA FCSH) e pretendeu analisar os comportamentos rítmico-locomotores mobilizados por crianças em idade pré- escolar face a um estímulo musical que apresenta mudanças de andamento.
O estudo apresenta um corte transversal. A recolha de dados foi realizada num jardim de infância do concelho de Sintra. Participaram 4 raparigas com 4 e 5 anos, tendo-se solicitado que, autonomamente, dançassem enquanto ouvissem música e fizessem uma estátua antes da música começar e após terminar. A tarefa foi realizada individualmente e registada em vídeo. O estímulo musical utilizado, “Le pereux qui devient courageux”, de Edgar Willems, é interpretado
ao piano e apresenta 3 secções: A de maior duração e mais lenta; B com um accelerando; C a mais rápida e com ritardando no final. A microanálise dos
vídeos foi realizada com o software ELAN considerando as categorias (padrões rítmicos locomotores, sequência de apoios, rotações e direção da locomoção) e respetivos indicadores de comportamento referidos na tese de doutoramento de Rodrigues (2012).
Os resultados mostram que: (i) existe uma predominância dos padrões
rítmicos locomotores “apoio sem progressão” e “andar” em todas as secções, correspondendo a 48.7% e 41.2% na secção A, 41.4% e 14.1% na secção B, e 27.7%
e 23.3% na secção C, respetivamente; (ii) na direção da locomoção existem todos os 7 indicadores possíveis na secção A e B, com predominância da “ação sem locomoção” (54.0% e 36.9%, respetivamente) e a progressão “para a frente” (29.5% e 11.5%, respetivamente), enquanto que na secção C apenas se codificaram estes dois indicadores (27.4% e 21.2%, respetivamente) e “vira para a direita” (1.9%); (iii)
as percentagens nas categorias de rotação com apoio fixo e apoio alternado
vão diminuindo ao longo das secções; (iv) nos apoios de locomoção existe maior utilização do pé esquerdo em todas as secções; (v) não foi encontrada uma relação entre a velocidade das secções e a regularidade da sequência de apoios.
Análise do comportamento rítmico-locomotor de crianças com 4 e 5 anos em situação de dança utilizando música gravada com diferentes andamentos.
A análise permitiu identificar qual o vocabulário rítmico-locomotor que as crianças estavam aptas a utilizar por iniciativa própria. Face à alteração de velocidade
ao longo do estímulo musical, verificou-se a supressão de comportamentos
ao nível da direção da locomoção, rotações com apoios fixos e alternados. As soluções motoras encontradas pelas crianças podem resultar da combinação
das capacidades rítmico-locomotoras e percetivas em relação à música. Assim, esta análise pode ser discutida à luz do conceito de zona de desenvolvimento potencial de Vygotsky (1978).