A voz cantada: um meio para a construção do ser relacional em crianças com perturbações da comunicação

Nascemos de um pranto que apela à vida. No primeiro choro anunciamos a nossa existência e relacionamo-nos, no tempo e no espaço, com o outro. Nesta relação, os pais desempenham um papel fundamental, sendo tutores informais atentos às primeiras necessidades básicas das crianças. Com elas partilham um código relacional intuitivo, com características exclusivas da díade, mas o qual assenta também num conjunto de características comunicativas universais. Embora nem sempre se tenha admitido que tais características fossem precursoras dos diálogos futuros, certo é que hoje não restarão dúvidas acerca do papel crucial dos elementos pré-linguísticos no desenvolvimento da comunicação. Tais elementos, mais do que se alicerçarem num quadro de referência exclusivo do desenvolvimento linguístico, antes farão parte de uma natureza mais lata e universal, transversal a diferentes formas de nos expressarmos, onde é possível encontrarmos características musicais. Na intervenção educativa com crianças com atraso global de desenvolvimento com consequências ao nível da capacidade de produzir e/ou coordenar a fala, uma atuação musical que favoreça e explore aqueles elementos basilares da comunicação linguística, poderá obter resultados positivos. Nesta comunicação apresentaremos o projeto aMUSe, o qual, partindo de elementos musicais presentes nas vozes, na repetição, nos silêncios, na variedade / contraste e na improvisação, resgata a informalidade das vocalizações, no sentido de desbloquear os trilhos da comunicação, quando esta parece estar à margem do universo social destas crianças.