Description
O crédito ao consumo, mais do que antecipar a compra futura de bens e serviços, desempenha um papel importante na estabilização do poder de compra das famílias, sobretudo em períodos de queda do rendimento1. Após a crise financeira internacional e a recessão económica portuguesa, o montante de novas operações de crédito ao consumo começou a recuperar a partir de 2013. O tipo de crédito que mais cresceu desde então foi o destinado à compra de automóvel. Sendo este um bem duradouro, refira-se neste contexto que as famílias portuguesas recorrem ao crédito sobretudo para adquirir bens que lhes aumentam o bem-estar futuro e de forma duradoura, ou seja, investimento.No seguimento da crise do subprime em 2007, e por influência das instâncias nacionais e europeias, a legislação de regulação e supervisão do setor tem aumentado na última década, sendo hoje, o setor do crédito ao consumo em Portugal, altamente regulado e sujeito a um exigente processo de supervisão. Não obstante, de acordo com estudos da Comissão Europeia, em 2010 Portugal já fazia parte dum restrito grupo de nove países que possuía uma restrição “forte” às taxas de juro máximas possíveis de aplicar aos contratos de crédito ao consumo. Em 2013 era o país com maior pontuação em termos de fornecimento de informação pré-contratual adequada aquando da concessão de crédito ao consumo.O impacto do crédito ao consumo na economia advém por diversas vias. Ao antecipar consumo aumenta a procura por bens e serviços e, consequentemente, a produção e o emprego de indivíduos. À medida que mais postos de trabalho são criados, maiores são as receitas do Estado por via do aumento das contribuições sociais e dos impostos indiretos resultantes do aumento do poder de compra. A literatura mostra também que o acesso ao crédito tem um efeito positivo no aumento do empreendedorismo e na capacidade dos indivíduos desempregados conseguirem empregos em empresas mais produtivas e com salários mais elevados, aumentando assim o bem-estar global da sociedade2.As taxas de juro registadas nos últimos anos têm permitido reduzir consideravelmente o esforço das famílias com o custo da dívida, que atualmente se situa em níveis historicamente reduzidos. A taxa de juro em Portugal sobre os novos contratos de crédito ao consumo é menos de dois pontos superior à média da zona euro. Apesar disso, observa-se uma convergência do custo deste tipo de crédito com a média dos parceiros do euro desde o início de 2012.A importância das instituições com atividade especializada na concessão de crédito aos consumidores tem vindo a aumentar desde 2013. A partir de 2015, estas instituições são responsáveis pela concessão de mais de metade deste tipo de crédito. Um inquérito realizado em maio de 2019 revelou que 92% dos clientes das instituições de crédito especializado (de ora em diante “crédito ASFAC”) estão satisfeitos, ou muito satisfeitos, com a escolha da instituição. Mais de 80% dos consumidores que ponderam obter crédito ao consumo no futuro estão satisfeitos com a clareza das informações prestadas pelas Instituições de Crédito Especializadas durante o processo de consulta.Apenas um quinto dos empréstimos concedidos a famílias é destinado ao consumo. A maior parte da dívida está sob a forma de crédito à habitação. Dados europeus do Inquérito à Situação das Famílias e dos Censos, sugerem que países onde o mercado de arrendamento não é tão relevante (como é o caso de Portugal) têm associado um peso da dívida com crédito à habitação mais elevado. Cruzando estes dados com o European Union Statistics on Income and Living Conditions, é ainda possível perceber que a proporção de agregados familiares portugueses que vive com excesso de despesas de habitação (6.7%) é inferior à média da UE28 (10.4%). Estes resultados mostram que, apesar da aquisição de casa própria impactar negativamente no nível da dívida das famílias portuguesas, permites-lhe ter custos totais com habitação mais baixos relativamente aos seus pares europeus.Além do mais, deverá ser observado que a existência de crédito à habitação implica necessariamente a existência de colateral, dado como garantia, em muitos dos casos a própria casa. Em caso de dificuldades em suportar os custos da dívida (por exemplo decorrentes do aumento da taxa de juro ou numa situação de desemprego), a possibilidade de converter parte desse colateral em liquidez ajudará a mitigar os impactos negativos sobre o rendimento corrente ou, em última instância, permitir mesmo a solvência dos respetivos passivos.Globalmente, os indicadores de incumprimento das famílias têm vindo a diminuir nos últimos anos, quer na componente de crédito à habitação quer na de consumo. Porém, é de salientar que, pese embora o stock de crédito vencido na finalidade habitação tenha sido historicamente mais baixo que na finalidade consumo, nos dois últimos anos essa tendência inverteu-se. Assim, a análise aos indicadores de incumprimento deverá ter em conta esta medida, sobretudo do ponto de vista da prevenção do risco sistémico.Os resultados deste estudo indicam que um aumento temporário e inesperado na oferta de crédito das associadas ASFAC em 1% aumenta o PIB português em 0.05%, após 1 ano, e em 0.1% após 2 anos. Isto significa que a oferta de crédito das associadas ASFAC tem um impacto significativo no nível de atividade da economia portuguesa no curto e médio prazo. Já se o aumento na oferta de crédito das associadas ASFAC for sustentado no tempo, ao invés de temporário, foi encontrado que o impacto sobre o PIB é de 0.6% após 2 anos, e de 1.15% após 5 anos. Como referido anteriormente, o impacto do crédito ao consumo na economia advém por diversas vias. Os resultados refletem tal afirmação, pois encontramos um efeito multiplicador – variação do PIB sobre a variação do crédito concedido pelas associadas da ASFAC – em aproximadamente 1 passado um ano, e de 1,5 passados dois anos. Isto é, um euro a mais de concessão de crédito das associadas da ASFAC traduz-se em aproximadamente 1 euro passado um ano, e 1 euro e 50 cêntimos passados dois anos. Finalmente, vale salientar que o efeito no PIB é significativo a 2 anos a um nível de 95% de confiança. Ao analisar o impacto do crédito ASFAC nos componentes do PIB, verificamos que o efeito do crédito ASFAC no PIB dá-se acima sobretudo através do consumo de bens duráveis e investimento. Quando o crédito ASFAC aumenta inesperadamente em 1%, o consumo de bens duráveis e investimento aumenta em 0.5% e 0.4%, respetivamente, passado dois anos. Encontramos também em paralelo que o impacto de um aumento da oferta de crédito ASFAC aumenta o número total de empregos e diminui a taxa de desemprego. De uma forma geral, concluímos que a oferta do crédito ASFAC está significativamente correlacionada com a atividade económica. O efeito na atividade económica se dá, sobretudo, através do aumento de consumo de bens duráveis, do investimento e emprego.Em seguida, procedemos a uma análise da decomposição da variância do erro de previsão do PIB. Esta decomposição da variância do erro de previsão do PIB é importante e complementar à análise anterior para se poder analisar a importância relativa do choque de crédito ASFAC em relação a todos os outros choques que atingem a economia. Ao fazer a decomposição da variância chegamos à conclusão de que o choque de crédito explica em aproximadamente 15% as variações no erro de previsão do PIB após dois anos. Isto significa que o choque é relevante para as dinâmicas do PIB não só de uma forma isolada, mas também quando comparado em conjunto com outros choques que atingem a economia.Dado que uma elevada parcela do crédito total ASFAC tem como principal finalidade a compra de veículos, no estudo é feita uma análise dedicada ao impacto na economia deste tipo de crédito. No geral, confirma-se que o crédito ASFAC com a finalidade compra de veículos tem efeitos maiores e mais persistentes sobre o PIB do que o crédito total ASFAC. Um aumento temporário e inesperado em 1% no crédito ASFAC para compra de veículos aumenta o PIB em 0.25% ao fim de dois anos e 0.5% ao fim de 3 anos. Ao analisar o impacto nas componentes do PIB do mesmo choque no crédito ASFAC para compra de veículos, verificamos que o impacto é estatisticamente significante e positivo sobre o investimento e o consumo de bens duráveis. Por fim, depois de apresentado o impacto médio do crédito ASFAC para todo o período em análise, fazemos uma decomposição histórica do PIB para analisar a contribuição das variações inesperados do crédito ASFAC no PIB ao longo do tempo. Nesta análise, concluímos que os choques na oferta de crédito total ASFAC foram relevantes para a dinâmica do PIB em Portugal nas últimas duas décadas. Em particular, os choques negativos, ou seja, de contração do crédito total ASFAC, contribuiram aproximadamente em metade para a redução do PIB na segunda metade de 2011 até à primeira metade de 2012. É de destacar também o facto da recuperação do PIB pós-crise de 2014 se dever, em grande medida, à recuperação do crédito total ASFAC. Sem o aumento do crédito ASFAC, o PIB seria aproximadamente 0.5% inferior ao registado no primeiro trimestre de 2018.
Period | 27 Jun 2019 |
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Work for | ASFAC - Associação de Instituições de Crédito Especializado, Portugal |
Degree of Recognition | National |