Do palco virtual para o quotidiano: disrupção, produtilização, e activismo

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Depois do primeiro confinamento da pandemia COVID 19 os arco-íris do «vamos ficar todos bem» transformaram-se na evidência «nada será como dantes».

O contacto físico tornou-se intimidade virtual, ficámos em tele-trabalho e o consumo apostou na transformação digital. No entanto, a cultura digital com as suas limitadas interfaces obriga-nos a fixar, durante horas, um ecrã; sentados, quase imóveis, escrevemos num teclado ou clicamos num rato – os olhos e o corpo adoecem, a plataformização ilude a criatividade, a fadiga Zoom instala-se.

Nunca as experiências da performance digital e da ciberformance foram tão pertinentes como agora, tanto a nível teórico – através de uma crítica de conceitos fracturantes como virtualidade, corporealidade, presença, interactividade, agenciamento ou imersão – como a nível empírico, através da criação de interfaces e ferramentas que permitem desenvolver a nossa condição digital de uma forma mais incorporada, amplificada e livre.
Desde 2008 que tento contribuir para um enquadramento teórico da ciberformance, a performance que acontece em plataformas, ambientes e mundos virtuais e que se caracteriza por ser ao vivo, mediada, intermedial, multimodal, híbrida, liminar, colaborativa e interventiva estética e socialmente, sendo low cost e usando tecnologia livre e acessível.
Há três décadas que acções performáticas cruzam o mundo físico com a Internet, ligando utilizadores e públicos distribuídos geograficamente. Fóruns e ambientes textuais de jogo foram os primeiros espaços usados por ciberformers tendo estes, mais tarde, apropriado ambientes gráficos e mundos virtuais online.

Com base na minha própria prática artística nesses contextos e em produção académica sobre a performance digital criei um enquadramento que visa possibilitar uma melhor definição e compreensão deste género artístico.

Procurei, assim, abrir caminho para uma análise do contributo deste tipo de arte para o panorama mais vasto da relação entre a comunicação à distância, a Interacção Humano Computador (IHC) e a arte contemporânea.

Tendo em conta o período histórico que vivemos, com uma maior dependência da utilização do computador e dos ambientes virtuais e uma maior consciencialização das consequências desta relação, por vezes tóxica, proponho-me verificar a possível adaptação dos conceitos deste tipo prática artística ao nosso quotidiano.

Dos debates que são fundamentais para a compreensão dos aspectos disruptivos da ciberformance alguns se destacam: o posicionamento estético no liminar; o mito da interactividade e como alterar esse constrangimento através de um maior agenciamento na participação; a oposição entre perspectivas imersionistas e aumentacionistas e a problematização da vertente activista desta forma de arte.

Em 1999 Susan Broadhurst sentiu que não havia conceitos operativos para pensar a performance vanguardista fazendo surgir um grande contributo para a teoria crítica da performance: o seu conceito de acto liminar que é a acção que é híbrida, indeterminada, sem aura, experimental, inovadora e intersemiótica, favorecendo modos não linguísticos.
O liminar, onde a ciberformance se inscreve, é fundamental para entender esta performance que é disruptiva, interventiva socialmente, que derruba ou cruza barreiras estéticas e que, por conseguinte, acaba por ter efeitos políticos a posteriori.


Na tentativa de actualizar este enquadramento teórico para a ciberformance afigura-se-me importante abordar a ideia do mito da interactividade desenvolvida por Johannes Birringer (2011), que me levou a admitir que o agenciamento e a participação na ciberformance são hoje ainda limitados tal como o são na nossa vida digital quotidiana – disto resultando que a nossa relação com o computador/telemóvel pode aumentar-nos mas não imergir-nos, um debate também aqui muito pertinente.

Se a interactividade na ciberformance é limitada pelos próprios meios podemos dizer, no entanto, que a interacção dos utilizadores da Internet tem sido bastante livre e produtiva, tendo essa relação surgido no âmbito do produser, o produtilizador de Axel Bruns (2008). Esta figura disruptiva do produtor que é também o utilizador está presente na ciberformance, não só no seu processo de produção e intercriatividade (Berners-Lee, 1999) como na relação entre performance e audiência.

Por fim, veremos ainda aqui que a ciberformance, a performance art que acontece nos ambientes virtuais usando as possibilidades técnicas da Internet, é estética, social e politicamente disruptiva em dois sentidos: primeiro, porque provoca e desafia os meios tecnológicos que utiliza, questionando o copy right e as corporações que vivem da Internet através da utilização de ferramentas open source e freeware; segundo, porque utiliza esses meios para criar acções que põem em causa tabus sociais, debatendo questões ambientais, de género ou etnicidade e desenvolvendo-se através de performances que problematizam a actual relação humano/computador.

Palavras-chave: ciberformance; liminar; ampliação; agenciamento; produsage
Period12 Apr 0020
Event titleXII Congresso SOPCOM: Disrupção e Comunicação
Event typeOther
LocationLisboa, PortugalShow on map
Degree of RecognitionInternational